CONSCIÊNCIA E PÉ NO ASSENTO

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Edição n° 36

Por Adailton Ferreira

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“Queremos mudanças já! Por um Brasil melhor!”.

A frase estava escrita, estampada em cores vivas, na camiseta do jovem à minha frente. O vagão do trem estava quase vazio; ele entrou e sentou-se enérgico. A mensagem era direta, crítica, incisiva; um convite aberto, insinuante, a uma longa reflexão. Mas quanta consciência existe dentro de uma almejada consciência? Quem saberá? Pergunta que tive que fazer, em silêncio, diante daquele jovem que se mostrava sedento por mudanças em seu país.

A princípio, quando ele se sentou, uma grande esperança desabrochou viva naquele momento. Todos nós, brasileiros em busca de um país melhor, ao ver manifestações deste tipo, desabrochando tão intensa em fina flor, claro que nos vemos tomados de uma aclamada alegria. Afinal de contas é a juventude; flor mais importante de um país, de uma nação. Pensamos na deterioração da cultura, na falta do respeito mútuo, que pouco a pouco vem sendo enterrado em carne viva; pensamos, enfim, na educação, que tantos enxovalhos vem sofrendo, e cada vez mais, nossos meninos e meninas, se vêm apartados dessa base significativa, desse direito humano e universal.

O jovem vinha de uma grande manifestação que se dera horas antes na Avenida Paulista. “Um país melhor”, é o que estava estampado na sua camiseta. Era uma voz inflamada, de um fôlego que ainda, sem dúvida alguma, devemos guardar alguma esperança. A única, talvez, que nos resta. Mas foram instantes somente. A luz tão intensa, tão viva, tão rica, à minha frente turvou-se. A palavra consciência tomou um grande solavanco; apartou-se em mil, e por isso me vi diante de inevitável pergunta. A cena? De tão natural, não conseguiu ser em si estarrecedora. Pareceu algo comum, atitude trivial do nosso dia a dia: ao sentar, no assento de frente, que por ora estava vazio (mas que logo adiante, com certeza, iria acolher a presença de alguém) ele depositou as solas inteiras (duas, de um tênis, que certamente havia pisado todo tipo de piso, asfalto, sujeira, rua) e ali as deixou como se estivesse pousando os pés numa almofada de descanso. Li novamente na sua camiseta, estampada em cores vivas:

“Queremos mudanças já! Por um Brasil melhor!”.