Edição n° 32
É dia ardente, de intenso calor; Carapicuíba está em chamas. Não arde somente o calor; queima uma sede insuportável, que abrasa as paredes, queima a terra, queima o asfalto. O ar chega pesado em torno de todos e por todos os cantos. Os carros estancam num trânsito infernal. Um cheiro penetrante toma conta do ar: cheiro de uma indisfarçável dúvida, cheiro de muita incerteza. O ar também é de rebeldia. Os gritos de sede, a pressa, a agonia, e vozes imensamente inúmeras, estão à procura de um copo cheio. O ar queima seco, sufocante, é um ar denso que desconforta a cidade. O município está isolado; ao longe brilha uma luz que não se sabe qual é a cor que o horizonte tem. Talvez seja a cor da esperança, não se sabe. Ninguém entra na cidade, ninguém sai, é o que parece. As pessoas pouco sorriem, pouco se olham, pouco se reconhecem. A multidão se aglomera e não se dispersa. Estão à procura de matar a grande sede, insuportável, sem fim. Mas não há lágrimas, não há lamentos, uma grande espera pesa sobre todos os olhos. O dia vai em brasas até o final da tarde; finalmente as urnas são levadas embora. A população respira exausta. O calor ardente atenua, agora entra devagarinho a noite. Será que amanhã haverá copo suficiente para a sede de justiça de todos? Será que pelo menos haverá justiça? Extenuada, a cidade dorme. Dorme Carapicuíba, foi dia de eleição!