Edição n°27
Não há como censurar o comportamento de um povo. Ele faz parte da sua cultura. E o comportamento do brasileiro não poderia ser diferente. Somos um povo formado por uma mistura de diversas etnias. Felizmente, parece termos herdado como dominante o gene da espontaneidade e da alegria. Isto fica muito evidente nas manifestações coletivas e nas festividades. Não por acaso, o carnaval é uma espécie de símbolo brasileiro, por aqui e no exterior.
Esta Olimpíada realizada em nosso país criou uma excelente oportunidade para que o mundo conheça um pouco mais do nosso jeito se ser. E parece que a forma como o brasileiro se comporta nas torcidas não agradou a alguns. Infelizes aqueles que, eventualmente, se sentem indignados. Não se muda o jeito de ser de um povo, e o brasileiro não vai mudar o seu. Mesmo o hábito da vaia nas torcidas faz parte dele. A vaia do brasileiro não é maldosa, não objetiva a humilhação. O brasileiro é capaz de vaiar seu próprio time, sua própria seleção. Então, que estrangeiros não esperem tratamento diferente.
Os estrangeiros devem procurar entender e aceitar nossas peculiaridades, assim como quando estamos em outro país temos de nos curvar ao seu jeito de ser. Lembro-me de um domingo de escaldante verão, na capital de certo país europeu, quando andava com minha mulher por uma dessas vias comerciais de circulação exclusiva para pedestres, que por aqui conhecemos como calçadão, à procura de uma refeição rápida. As opções eram muitas. Com um pouco de sorte encontraríamos uma “comidinha” brasileira. Nosso entusiasmo foi imediato ao ouvir uma rádio brasileira sintonizada em um dos restaurantes, com mesas externas ao abrigo de guarda-sóis.
A opção pelo lugar foi por impulso. Ocupamos uma das poucas mesas disponíveis. Comida brasileira não havia, mas a decisão foi de permanecer. Minha cadeira balançava ao som da música que vinha do meu País! Senti-me completamente em casa, a ponto de fazer um ingênuo comentário entoado com meu inglês rudimentar, tão logo se aproximou um atendente: vocês sintonizando uma rádio brasileira! Você fala português? O rapaz em tom frio, como a tratar com um forasteiro idiota, disparou: estar aqui significa que você fala minha língua? (não vou fazer referência direta ao idioma, como ele o fez, para não denunciar o país). Minha mulher me advertia com um olhar de reprovação.
Fiquei de tal forma desconcertado que o atendente logo percebeu. Sua expressão continuava a denunciar frieza, mesmo quando tentou ser simpático para minimizar meu evidente mal estar: senhor, a sintonia da rádio é em sua homenagem. Melhor teria sido se ele não tivesse tentado, pois a cada segundo aumentava a minha decepção pela gafe, por não ter percebido que o jeito de ser daquele povo não condiz com a espontaneidade do brasileiro. Nem por isso eu poderia censurá-lo. O estrangeiro deve procurar assimilar o jeito de ser do país em que se encontra. Não pode pretender o contrário.
Não se pode negar que o comportamento da nossa torcida se torna, às vezes, inconveniente. Explico, exemplificando: é evidente que quando uma ginasta se concentra para executar sua coreografia associada a uma musica, e as manifestações da plateia, ainda que de ovação, não lhe permitem distinguir o ritmo, sua apresentação pode ficar prejudicada. O mesmo pode ocorrer em exibições outras em que a concentração seja fundamental. Porém, mesmo em tais situações, não se pode atribuir à plateia brasileira a intenção deliberada de provocar prejuízo a qualquer competidor.
A despeito de tudo, a Olimpíada certamente deixará um saldo muito positivo na forma como nosso País é visto pelo mundo. Trouxe-nos grandes alegrias, com conquistas inéditas. Como exemplo, o ouro da seleção olímpica de futebol masculino, que se realiza no exato momento em que estas linhas são finalizadas. Muitos exemplos de superação dos nossos atletas também puderam ser testemunhados. E um dos maiores atletas da atualidade – Michael Phelps –, já em seu País, publicou em sua página a alegria de ter participado, de ter estado por aqui e o agradecimento pela acolhida que teve no Rio de Janeiro. Não podemos ter a pretensão de agradar a todos, mas poucos não terão compreendido que a forma como nos manifestamos é espontânea, incontida, irresistível, é brasileira. É simplesmente o nosso jeito de ser!