IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Lei 8.429 /92: ENTENDA O QUE É E A QUEM SE APLICA

Edição n° 24

Por Fabiana Rodovalho Nemet

Diante do atual cenário político que permeia a gestão administrativa da cidade de Carapicuíba, a Folha Carapicuibana elencou algumas questões básicas comumente aos últimos acontecimentos, sanando as dúvidas de inúmeros munícipes.

O que é improbidade administrativa?

O termo “Improbidade administrativa” é atribuído a determinadas condutas praticadas por agentes públicos e também por particulares que nelas tomem parte. Em outras palavras, Improbidade administrativa nada mais é que “corrupção administrativa”, isto é, o oposto à honestidade, à boa-fé, à honradez, à correção de atitude. O ato de improbidade nem sempre será um ato administrativo, podendo ser qualquer conduta comissiva ou omissiva praticada no exercício da função ou fora dela.

Neste sentido a Lei 8.429 /92, conhecida como LIA (Lei de Improbidade Administrativa) e como Lei do “colarinho branco”, dispõe que:

Art. 5º Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.

Há na Constituição Federal de 1988 diversos dispositivos que tratam da improbidade, como o artigo 14 , § 9º (cuida da improbidade administrativa em período eleitoral), artigo 15 ,V (veda a cassação de direitos políticos, permitindo apenas a suspensão em caso de improbidade), artigo 85 , V (tipifica a improbidade do Presidente da República como crime de responsabilidade) e artigo 37 , § 4º (dispõe algumas medidas aplicadas em caso de improbidade).

De acordo com a Lei 8.429 /92, para caracterizar o ato de improbidade administrativa deverá ocorrer uma das características abaixo (modalidades de atos de improbidade):

1) enriquecimento ilícito (art. 9º)

2) dano ao erário (art. 10)

3) violação à princípio da Administração (art. 11)

(Princípios da administração: Legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [dentre outros])

Improbidade administrativa é corrupção?

Sim, todavia, ante qualquer coisa é bom frisar que a ideia comum de corrupção corresponde a um conceito não-jurídico, ou seja, que não deriva de normas jurídicas nem se refere a uma figura jurídica. No sistema jurídico brasileiro, existem apenas as figuras jurídicas da “corrupção passiva” e da “corrupção ativa”, conforme os artigos 317 e 333 do Código Penal, além da “corrupção de menores”, conforme o artigo 218 do Código Penal. Contudo, a ideia comum de corrupção, de conhecimento geral da população, é mais ampla, proveniente de um conceito construído a partir de diversas disciplinas, tais como a Ciência Política, a Sociologia etc. Esse conceito mais amplo diz respeito ao mau uso da função pública com vistas na obtenção de uma vantagem particular – conforme ocorrido na atual gestão administrativa da cidade de Carapicuíba, conforme consta os autos em poder do Ministério Público (vide edição da matéria Coluna S.O.S. Prefeito >Justiça suspende os contratos de 203 “empregados apadrinhados” na gestão do prefeito Sérgio Ribeiro<)

Quem é vítima de atos de improbidade administrativa?

Conforme o artigo 1o da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) as vítimas (pessoas jurídicas de Direito público e privado) podem ser a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e os Territórios (atualmente não existem territórios). Esses entes executam suas atividades por intermédio de órgãos próprios, que compõem o que se chama de administração direta, e também criam outras pessoas jurídicas ex.: empresas públicas (Correios; Caixa Econômica Federal); sociedades de economia mista (Banco do Brasil) e fundações (Fundação Getúlio Vargas). Sempre que o ato de improbidade (conhecido como ímprobo) for praticado em prejuízo de um Ministério (órgão da União), o sujeito passivo será a União; se houver ato de improbidade contra uma Secretaria de Estado (órgão do Estado), a vítima será o Estado; se o ato ímprobo for praticado contra uma Secretaria Municipal (órgão do Município), o Município será o sujeito passivo. Os entes que integram a administração indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios são: autarquias (ex.: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE); empresas públicas (ex.: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, Caixa Econômica Federal – CEF); sociedades de economia mista (ex.: Banco do Brasil); fundações (ex.: Fundação Nacional do Índio – Funai); e serviços sociais autônomos (ex.: Serviço Social da Indústria – Sesi, Serviço Social do Comércio – Sesc). Nesses exemplos, a vítima do ato de improbidade é a própria pessoa jurídica (autarquia, fundação etc.).

Também pode ser vítima a empresa incorporada ao patrimônio público, além da entidade cujo patrimônio, receita anual ou custeio provenha, em mais da metade (mais de 50%), do governo.

Como exceção a regra, as empresas privadas ou particulares podem ser vítimas de atos de improbidade?

Sim. As empresas ou entidades que tenham recebido auxílio do Poder Público, qualquer que seja o montante, podem sofrer atos de improbidade administrativa que atentem contra o seu patrimônio. Ex.: a empresa particular que recebeu terreno em doação da prefeitura com o objetivo de instalar seu parque industrial; a empresa que, para instalar-se em determinado município, fica desobrigada de pagar impostos municipais por determinado prazo.

Partidos políticos podem sofrer atos de improbidade administrativa?

Sim. Além de receber recursos de origem privada, os partidos recebem recursos provenientes do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, conhecido como “Fundo Partidário”. Conforme o artigo 38 da Lei n. 9.096/1995, esse Fundo é composto, em grande parte, de recursos de origem pública. Ao receber recursos do Fundo Partidário, os partidos políticos recebem as chamadas “verbas públicas”. A aplicação suspeita ou irregular deve ser investigada. Comprovada a improbidade, os responsáveis sujeitam-se às penas da lei.

Sindicato pode ser vítima de ato de improbidade administrativa?

Sim. Sindicatos não recebem verbas do Poder Público diretamente. Sua receita provém da contribuição dos integrantes da categoria profissional que representam – por esta razão que todo trabalhador, sócio do sindicato que representa a sua categoria, tem necessariamente que pagar uma taxa de contribuição mensal. Essas taxas de contribuição, recebidas pelos sindicatos, se tornam “recursos públicos”. O pagamento da contribuição sindical não é voluntário, mas obrigatório, pois decorre de lei (artigos 548, a, 578 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 217, inciso I, do Código Tributário Nacional). A pessoa que pertence a uma categoria profissional está obrigada a contribuir, de maneira semelhante ao que ocorre com os impostos, que são também obrigatórios e captados da população, enfim, do público em geral.

A pessoa natural (costumeiramente chamada de “pessoa física”) não poderá ser sujeito passivo de ato de improbidade?

Não. De forma lógica, se a pessoa natural (física) prejudicada não pode ser sujeito passivo de ato de improbidade administrativa, logo, não poderá mover a ação por improbidade, mas poderá mover outro tipo de ação judicial. Conforme o artigo 1º , parágrafo único, da Lei n. 8.429/1992 (LIA), o sujeito passivo da improbidade – a vítima – será sempre uma pessoa jurídica. Isso decorre da própria finalidade da lei, de proteger a moralidade administrativa. A pessoa física pode, eventualmente, ser prejudicada por um ato de improbidade, mas a situação que configurar improbidade sempre envolverá uma pessoa jurídica também lesada com a conduta ímproba.

Ex.: Prefeito municipal despreza a ordem de chamada de candidatos aprovados em concurso público que está prestes a perder a validade, resolvendo chamar um candidato que está no final da lista para ocupar determinado cargo público.

Esse favorecimento representa ato de improbidade que lesa a moralidade pública e prejudica os candidatos que, mais bem classificados no concurso, tinham preferência na ordem de convocação. Todavia, ainda que prejudicada por ato de improbidade, a pessoa física não tem direito de promover a respectiva ação, mas poderá mover outra ação a fim de requerer indenização, além de poder mover uma ação popular.

Administradores e empregados de organizações sociais e organizações da sociedade civil de interesse público podem ser culpados por cometer atos de improbidade e, assim, responsabilizados na forma da Lei n. 8.429/1992?

Sim. Se comprovada a prática de ato tipificado nos artigos 9º , 10 e 11, os administradores e empregados poderão sofrer as penalidades da Lei n. 8.429/1992, atentando-se apenas para as limitações fixadas no artigo 1º e seu parágrafo único. Qualquer espécie de fomento público não é mera liberalidade, senão instrumento de realização do interesse público. Portanto, se, no decorrer da execução de suas obrigações, for verificado ato tipificado como improbidade administrativa, o sujeito é considerado agente público e, nessa condição, responde na forma da Lei n. 8.429/1992.

Entes privados que celebrem convênios com a administração pública também respondem na forma da Lei n. 8.429/1992?

Sim, o raciocínio é o mesmo: ainda que não se comprove participação de agente público, uma vez detectada a prática de improbidade administrativa por sujeitos do ente particular convenente, impõe-se a responsabilização na forma da Lei n. 8.429/1992, atentando-se apenas para as limitações fixadas no artigo 1º e seu parágrafo único. Assim, qualquer desvio de recursos será sancionado pela Lei n. 8.429/1992.

Cabe aplicar a Lei de Improbidade Administrativa a quem não é nela qualificado como agente público?

De acordo com os dispositivos da própria Lei n. 8.429/1992, há equiparação àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Desse modo, comprovado o liame objetivo e subjetivo que vincula certa pessoa física ou jurídica à prática de improbidade, todos responderão solidariamente pela imoralidade que será sancionada na forma da Lei n. 8.429/1992.

Obs.: No texto da Lei existe a expressão “no que couber” ao dispor da responsabilização da pessoa física ou jurídica, pois há sanções incompatíveis com a situação de terceiros (ex.: perda da função pública).

Em qualquer hipótese, deve o beneficiário de um ato de improbidade administrativa responder na forma da Lei n. 8.429/1992?

Não. A lei qualifica a responsabilidade pelo benefício direto ou indireto se o beneficiário tiver o conhecimento da imoralidade que contamina a validade do ato que gerou o benefício imoral. Em outras palavras, se não houver prova de recebimento voluntário e consciente, derivado de atividade ímproba, não há como responsabilizar na forma da Lei n. 8.429/1992.