Edição n°06
Considerações sobre o impeachment
Inicialmente, vale considerar que o impeachment não é um julgamento judicial, mas sim um julgamento político. Isto não significa que aquele que é submetido ao processo de impeachment não tem oportunidade de se defender. A Constituição Federal estabelece condicionantes sem as quais o impeachment não tem como prosperar. E não são condicionantes de fácil superação.
Peguemos como exemplo o caso do Presidente da República (utiliza-se aqui o gênero no masculino por estar-se falando em tese), tendo em conta que várias outras autoridades da República estão sujeitas ao impeachment. O primeiro requisito é que tenha sido cometido um crime de responsabilidade. Os crimes de responsabilidade que podem ser cometidos pelo Presidente da República estão previstos no art. 85 da Constituição, combinado com a Lei nº 1079 de 1950.
A partir da caracterização do crime de responsabilidade, para que o Presidente da República possa sofrer o processo de impeachment será necessário o acolhimento por pelo menos dois terços dos membros da Câmara dos Deputados (que são 513). A partir daí a Câmara dos Deputados autorizará a instauração do processo, que passará a correr no Senado Federal. Portanto, o processo de impeachment somente poderá ser iniciado com a concordância de pelo menos 342 Deputados. Nesta fase, o Presidente da República terá oportunidade de apresentar sua defesa. Qualquer irregularidade verificada no processo também poderá ser submetida ao órgão máximo do poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF).
Após esta etapa, será necessário que o Senado Federal resolva de forma majoritária se processará ou não o impeachment. Resolvendo que o fará, o Presidente da República será afastado das suas funções pelo prazo máximo de 180 dias. Não sendo realizado o julgamento neste prazo, o Residente da República reassumirá suas funções, podendo o processo prosseguir regularmente.
O julgamento será realizado pelo Senado Federal, em sessão presidida pelo Presidente do STF. Note-se que o papel do Presidente do STF neste caso não é de juiz, apenas preside a sessão cuidando da observância da lisura do processo. O Presidente da República será considerado impedido se assim for decidido por dois terços dos Senadores (que são 81). Portanto, para que o Presidente da República seja impedido, será necessário o voto de 54 Senadores.
Como se pode perceber, para que ocorra o impedimento do Presidente da República torna-se necessária uma ampla adesão dos parlamentares, que são eleitos para exercer o poder em nome do povo. Portanto, tendo o Presidente da República adesão de mais que um terço (172 membros) da Câmara dos Deputados ou de mais que um terço (28 membros) do Senado Federal, o impeachment não terá como prosperar.
Assim, não se pode classificar como golpe um procedimento previsto e regulado pela Constituição Federal. Vale ressaltar que a própria Constituição Federal prevê a criminalização daquilo que caracteriza golpe de Estado, como ao dispor no art. 5º, inciso XLIV, que constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
Por último, acrescente-se que o Brasil vive o chamado presidencialismo de coalisão, em que a governabilidade fica na dependência de uma base parlamentar que garanta o mínimo de apoio às políticas do governo. Portanto, se o Presidente da República não contar nem mesmo com a adesão mínima necessária para evitar um processo de impeachment (um terço dos Deputados Federais ou um terço dos Senadores), a própria governabilidade estará comprometida.